Amor de Perdição by Camillo Castello Branco


Main
- books.jibble.org



My Books
- IRC Hacks

Misc. Articles
- Meaning of Jibble
- M4 Su Doku
- Computer Scrapbooking
- Setting up Java
- Bootable Java
- Cookies in Java
- Dynamic Graphs
- Social Shakespeare

External Links
- Paul Mutton
- Jibble Photo Gallery
- Jibble Forums
- Google Landmarks
- Jibble Shop
- Free Books
- Intershot Ltd

books.jibble.org

Previous Page | Next Page

Page 49

--Assim foi; mas, se eu o n�o matasse, matava-me elle.

--Ent�o de que voga o exemplo?!

--Eu sei c� de que voga? O frei Anselmo dos franciscanos � que pr�ga aos
paes que levem os filhos a v�rem os enforcados.

--Isso ha de ser para o n�o esfolarem a elle, quando elle nos esfola com
os peditorios.

T�o desassombrado ia o espirito de Sim�o, que algumas vezes lhe esvoa�ou
nos labios ura sorriso, desafiado pela philosophia do povo, �cerca da
forca.

Recolhido ao seu quarto, foi intimado para appellar dentro do prazo
legal. Respondeu que n�o appellava, que estava contente da sua sorte, e
de boas aven�as com a justi�a.

Perguntou por Marianna, e o carcereiro lhe disse que a mandava chamar.
Veio Jo�o da Cruz, e a chorar se lastimou de perder a filha, porque a
via delirante a fallar em forca, e a pedir que a matassem primeiro.
Agudissima foi ent�o a d�r do academico ao comprehender, como se
instantaneamente lhe fulgurasse a verdade, que Marianna o amava at�
morrer. Por momentos se lhe esvaiu do cora��o a imagem de Thereza, se �
possivel assim pensal-o. V�l-a-ia por ventura como um anjo redemido em
serena contempla��o do seu creador; e veria Marianna como o symbolo da
tortura, morrendo a peda�os, sem instantes de amor remunerado que lhe
dessem a gloria do martyrio. Uma, morrendo amada; outra, agonisando, sem
ter ouvido a palavra �amor� dos labios que escassamente balbuciavam
frias palavras de gratid�o.

E chorou ent�o aquelle homem de ferro. Chorou lagrimas que valiam bem as
amarguras de Marianna.

--Cuide de sua filha, senhor Cruz!--disse Sim�o com fervente supplica ao
ferrador.--Deixe-me a mim, que estou vigoroso e bom. V� consolar essa
creatura, que nasceu debaixo da minha m� estrella. Tire-a de Vizeu:
leve-a para sua casa. Salve-a, para que n'este mundo fiquem duas irm�s
que me chorem. Os favores que me tem feito, j� agora dispensa-os a
brevidade da minha vida. D'aqui a dias mandam-me recolher ao oratorio:
bom ser� que sua filha ignore.

De volta, Jo�o da Cruz achou a filha prostrada no pavimento, ferida no
rosto, chorando e rindo, demente em summa. Levou-a amarrada para sua
casa, e deixou a cargo d'outra pessoa a sustenta��o do condemnado.

Terribilissimas foram ent�o as horas solitarias do infeliz. At� �quelle
dia, Marianna, bem quista do carcereiro e protegida pela amiga de D.
Rita Preciosa, tinha franca entrada no carcere a toda a hora do dia, e
raras horas deixava s�sinho o pr�so. Costurava, em quanto elle escrevia,
ou cuidava do amanho e limpeza do quarto. Se Sim�o estava no leito
doente ou prostrado, Marianna, que tivera alguns principios de escripta,
sentava-se � banca, e escrevia cem vezes o nome _Sim�o_, que muitas
vezes as lagrimas diliam. E isto assim, durante sete mezes, sem nunca
proferir nem ouvir a palavra amor. Isto assim, depois das vigilias
nocturnas, ora em preces, ora em trabalho, ora no caminho de sua casa,
onde ia visitar o pae a deshoras.

Nunca mais o pr�so, na perspectiva da forca, viu entrar aquella doce
creatura o limiar da ferrada porta, que lhe graduava o ar medido e
calculado para que as honras da asphyxia as gozasse o cordel do
patibulo. Nunca mais!

E, quando elle avocava a imagem de Thereza, um capricho dos olhos
quebrantados lhe affigurava a vis�o de Marianna ao par da outra. E
lagrimosas via as duas. Saltava ent�o do leito, fincava os dedos nos
esp�ssos ferros da janella, e pensava em partir o craneo contra as
grades.

N�o o sostinha a esperan�a na terra nem no ceu. Raio de luz divina
j�mais penetrou no seu ergastulo. O anjo da piedade incarn�ra n'aquella
creatura celestial, que enlouquec�ra, ou voltara para o ceu com o
espirito d'ella. O que o salvava do suicidio n�o era, pois, esperan�a em
Deus, nem nos homens: era este pensamento: �A final, _covarde_! Que
bravura � morrer quando n�o ha esperan�a de vida!? A forca � um
triumpho, quando se encontra ao cabo do caminho da honra!�




Previous Page | Next Page


Books | Photos | Paul Mutton | Mon 22nd Dec 2025, 11:16